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País não terá ruptura nem mudança de rumo

O presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, chegou à estância suíça de Davos trazendo uma mensagem aos frequentadores da montanha mágica com interesse na economia e na política brasileiras: as eleições deste ano representam uma oportunidade e não um risco, a agenda de centro prevalecerá, separem o que é discurso de campanha e o que é projeto efetivo de governo.

Trabuco, um dos painelistas no jantar de amanhã oferecido pelo Fórum Econômico Mundial ao presidente Michel Temer, antecipou ao Valor o tom que pretende transmitir em suas conversas nesta semana. Pode ser que, no jantar, já se saiba a decisão do julgamento do ex-presidente Lula. "A economia real vai acordar normalmente no dia seguinte", disse. "Todo processo eleitoral tem uma polarização em torno de extremos, mas existe uma maioria que deseja o encaminhamento pelo centro. Só que essa maioria ainda não se manifestou, talvez porque os candidatos não estejam totalmente definidos ou consagrados", afirmou.

Quanto ao processo de sucessão no Bradesco, o executivo avisa: o nome deve sair até o dia 10 de fevereiro e será pinçado entre os sete atuais vice-presidentes. Trabuco, que ficará à frente do conselho de administração, pretende seguir indo anualmente ao Fórum de Davos. A seu lado, como nas últimas edições, está um dos vice-presidentes do banco: Maurício Minas, responsável pela área de tecnologia, visto como um dos favoritos.

Valor: Em um ano de tantas incertezas políticas e eleitorais, qual é a mensagem que o senhor traz a Davos sobre o Brasil neste ano?

Luiz Carlos Trabuco Cappi: Qualquer que seja a escolha das urnas, o Brasil não vai sofrer rupturas ou viver uma mudança de rumos em 2018. As eleições presidenciais devem ser vistas não como risco, mas como oportunidade de iniciarmos uma nova etapa em termos de estabilidade institucional e segurança jurídica. Com as nossas características, com os nossos freios e contrapesos, somos um país funcional. Depois de tanta turbulência nos últimos anos, com recessão e instabilidade política, temos as instituições funcionando e vamos terminar 2018 com avanços, apesar das contrariedades e idiossincrasias do mundo político. O Brasil vai entrar no rumo.

Valor: Por que o senhor acha que as eleições deste ano representam mais oportunidade do que risco?

Trabuco: Quando há um processo eleitoral, define-se uma agenda nova. E será uma agenda de centro. Ninguém vai ganhar as eleições e esquecer a recuperação da economia. É verdade que o ano de 2018 tem uma retomada cíclica. Mas podemos pegar essa herança de 2018 - juros baixos, inflação comportada, queda do desemprego - como base para o ano que vem. Falta uma agenda de crescimento, que passa pelo encaminhamento das reformas e pela modernização da infraestrutura. Chegaremos a Davos com cobranças em 2019.

Valor: Mas o que justifica apostar em uma agenda de centro quando os candidatos mais à esquerda e à direita, se somados, têm hoje quase 60% das intenções de voto?

Trabuco: Todo processo eleitoral tem uma polarização em torno de extremos, mas existe uma maioria que deseja o encaminhamento pelo centro. Só que essa maioria ainda não se manifestou, talvez porque os candidatos não estejam totalmente definidos ou consagrados. É evidente que, em ano de eleições e com uma ampla agenda de debates sobre os problemas brasileiros, podemos até ter um aumento da volatilidade. Seria típico e natural deste momento. Expectativas ficam sempre ao sabor de pesquisas e linhas dos candidatos, mas precisamos separar o que é discurso de campanha e o que são os projetos de governo. Importa mesmo o que vai ser feito a partir de janeiro de 2019. E aí não vejo a predominância ou a probabilidade de ações disruptivas. Aposto em um cenário construído em cima de conquistas e valores que a sociedade quer. E os empresários precisam de previsibilidade para investir.

Valor: O julgamento de Lula ocorre durante o Fórum de Davos e pode reforçar a imagem de divisão do país. Acha que seria recomendável a Justiça permitir a candidatura para evitar acusações de perseguição ao ex-presidente?

Trabuco: Não gostaria de discutir essa possibilidade, mas o país tem maturidade democrática e instituições funcionando. Independentemente da decisão, a economia real acordará normalmente no dia seguinte. Temos uma agenda irreversível. E uma economia se descolando da política. Acho que não haverá anticlímax pelo julgamento.

Valor: O setor bancário não vê, então, o risco de o populismo prevalecer nas eleições brasileiras?

Trabuco: Eu não vejo, nem seria desejável. Isso já passou. Tivemos experiências que mostraram ganhos e perdas em momentos mais populistas, mas a racionalidade agora é retomada. Eu fico me perguntando, com relação aos temas mais relevantes da agenda global e brasileira, como precisamos enfrentar determinadas questões de maneira central e serena. Tem a reforma da previdência. É desejável que ela seja aprovada em fevereiro. Mas, se por acaso não for votada agora, volta como agenda prioritária no próximo governo. No Brasil, a discussão sobre reforma previdenciária é ainda muito fundamentada na situação das finanças públicas e na desigualdade dos benefícios entre setor público e privado. Essa discussão é pertinente. Mas estamos em um estágio anterior ao do resto do mundo, que debate suas reformas diante da perspectiva de envelhecimento da população e de grandes mudanças no perfil demográfico.

"O processo de sucessão [no banco] tem uma agenda definida. Os nomes estão sendo escrutinados"

Valor: A atual proposta de reforma ficou desidratada. Se ela passar agora, os meios políticos não podem ficar relaxados quanto à necessidade de mudanças de longo prazo nas regras de aposentadorias?

Trabuco: Reforma da Previdência ou do seguro social é coisa para ser levada meio que no gerúndio. Temos passado por uma mudança tão grande de paradigmas no chamado "pacto de gerações", com trabalhadores da ativa custeando aposentados, que essa agenda se torna permanente. Mesmo uma reforma mais pontual, de menor impacto, deixa uma necessidade para este e para os próximos governos. Não dá para contestar os dados da demografia: queda da natalidade e aumento da expectativa de vida. Ressalto: a reforma do seguro social é permanente e inevitável para evitar um conflito de gerações. Mesmo que não houvesse o problema fiscal, esse tema deveria ser endereçado. Na semana passada, recebi a visita de alguns executivos japoneses e perguntei qual era a idade mínima para aposentadorias: 75 anos! Tudo bem, é outra realidade, mas ilustra a mudança profunda de paradigmas.

Valor: Há um certo clima de bolha especulativa com o crescimento das bolsas globais nas últimas semanas, mesmo sem se saber o que é. Há risco de nova crise financeira?

Trabuco: O cenário externo tem sido benigno para a economia brasileira. No fórum do ano passado, não tínhamos em perspectiva aquilo que enxergamos hoje: um crescimento disseminado nos Estados Unidos, na Europa, na Ásia e até nos países emergentes. As commodities estão firmes, sem exageros. A produção agrícola no mundo tem mantido quantidade e valor. Os riscos de uma bolha, que estão dentro do mapeamento feito no Fórum, passam por imaginar o comportamento da autoridade monetária nos Estados Unidos. O Fed, pelas previsões e pelos desejos, será gradualista. Isso dá um lastro favorável ao Brasil. Os riscos envolvem uma aceleração súbita da inflação no mundo, se houver repasse para salários, com aumento mais rápido e elevado da taxa de juros. Isso poderia proporcionar realização nas bolsas, que estão em seus máximos históricos. Mas 2018 está contratado e parece marcar o fim do processo da crise de dez anos atrás. É o último ano da política monetária expansionista. Não significa aperto monetário, mas a redução dos estímulos. A dívida consolidada nos Estados Unidos - governo central, famílias, poderes locais, empresas - chega a 350% do PIB. Uma alta de apenas 1 ponto percentual nos juros causaria profundo impacto na economia americana. Por isso, o gradualismo manterá os mercados funcionando.

Valor: Qual é a sua expectativa para o PIB do Brasil neste ano?

Trabuco: Ao redor de 3%. O câmbio está bem comportado e reflete um Brasil entrando nos trilhos. Quando houve o downgrade [da Standard & Poor's], foi surpreendente a falta de uma visão destrutiva dos mercados. Por quê? Porque o mundo dá um voto de confiança ao país. O superávit da balança comercial, o investimento estrangeiro direto, as emissões das empresas brasileiras são recordes. A decisão do Tesouro Nacional de emitir [títulos] na semana passada não foi para ter fluxo de caixa, mas para testar o funcionamento do mercado após o rebaixamento da S&P. No ano passado, foi surpreendente a quantidade de empresas que usaram o canal do equity para melhorar seus balanços patrimoniais. Neste ano, temos quatro ou cinco emissões de bonds de empresas visando fortalecer seus balanços para uma retomada da economia.

Valor: Acha possível chegarmos a 4% de crescimento em 2018?

Trabuco: Fico com algo em torno de 3%. Temos um ano diferente: Copa do Mundo, eleições, expectativa de mudança de governo. Estamos vivendo o capítulo posterior à recuperação cíclica. Precisa transformar-se em uma retomada mais consistente. Com o PIB crescendo isso, dá para imaginar uma ampliação de 5% do crédito. A fragilidade fiscal e o processo eleitoral constituem pendências, há capacidade sobrando na indústria. As montadoras ainda têm 45% de ociosidade. Isso se vê no crédito também. O crédito chegou a representar 54,5% do PIB e hoje equivale a 46%. Existe espaço para ampliação. Essa capacidade ociosa está para ser colocada em andamento. O próximo ciclo de crescimento é de médio prazo, mas ele se consagrará apenas com as reformas macro e microeconômicas. As famílias estão com seus balanços ajustados. As empresas, operacionalmente, estão melhores do que nos últimos anos. E não temos pressões inflacionárias. Se as famílias estão prontas para voltar a consumir e as empresas estão com seus balanços ajustados, entramos em um ciclo no qual a ausência da inflação e os juros baixos beneficiam todos. Não podemos subestimar a influência que uma política monetária de juros baixos tem para reativar a economia brasileira.

Valor: Qual é sua avaliação sobre a cobrança do governo aos bancos para que ofereçam juros mais baixos no cheque especial?

Trabuco: É natural que, depois de uma redução tão grande da taxa básica, haja uma demanda para que os juros de determinadas linhas de crédito apresentem queda. A discussão é adequada. O Ministério da Fazenda e o Banco Central estão endereçando essa questão. E a Febraban está trabalhando no sentido de um alinhamento com Fazenda e BC. Mas, quando se anualiza a taxa do cheque especial, há imperfeições na análise. Ele é um instrumento de crédito para o cliente usar por alguns dias, não por um ano. Uma autorregulação, uma atitude dos bancos para oferecer enfaticamente outras linhas de crédito mais adequadas, é natural. Não somos contra a iniciativa do BC, que é pública inclusive, dentro de uma agenda estabelecida como metas prioritárias.

Valor: Como está o processo de sucessão na presidência do banco?

Trabuco: O processo de sucessão tem uma agenda definida. Os nomes estão sendo escrutinados dentro dos sete candidatos naturais, que são os vice-presidentes. Nesse ponto, não haverá surpresas. A filosofia do banco é valorizar os quadros de carreira, pratas da casa, mas não existem regras pré-estabelecidas em relação ao tempo de Bradesco. Desde 2009 estamos fazendo uma renovação do corpo executivo. Não há preconceitos. O nome vai surgir dentro da relação de vice-presidentes. O nosso objetivo é ter um banco competitivo e fincado em valores.

Valor: E qual será o "timing"?

Trabuco: Trinta dias antes da assembleia de acionistas, que acontece no início de março, existe a designação da chapa de conselheiros. É o novo conselho de administração que elege o presidente-executivo. Quando essa chapa for divulgada, lá pelos dez primeiros dias de fevereiro, anuncia-se também o novo presidente-executivo. Ele então deverá ser votado e eleito após a eleição do novo conselho.