Moraes suspende julgamento sobre prorrogação da desoneração da folha

Análise virtual foi interrompida após três votos favoráveis à manutenção do acordo entre Congresso e governo para compensação fiscal
O ministro Alexandre de Moraes, do STF, pediu vista e suspendeu o julgamento que discute a constitucionalidade da lei de 2023 que prorrogou a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia e de determinados municípios até 2027.
A análise teve início na última sexta-feira, 17, em plenário virtual, e foi interrompida nesta terça-feira, 21, após o pedido do ministro.
Até o momento, o relator, ministro Cristiano Zanin, e os ministros Edson Fachin e Gilmar Mendes, votaram para validar o acordo firmado entre o Congresso Nacional e o governo Federal, que prevê mecanismos de compensação e reoneração gradual dos setores beneficiados a partir deste ano.
O caso trata do mérito da ação proposta pela União, que questiona a validade da desoneração sem a indicação das fontes de compensação financeira, conforme exige o art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Ao analisar o caso, ministro Cristiano Zanin votou pela parcial procedência da ação direta de inconstitucionalidade.
Zanin reconheceu que os arts. 1º, 2º, 4º e 5º da lei violaram o art. 113 do ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que exige a estimativa do impacto orçamentário e financeiro para proposições legislativas que criem despesas obrigatórias ou impliquem renúncia de receita.
Para o ministro, a norma representa um avanço no regime fiscal brasileiro e busca garantir a sustentabilidade orçamentária, elemento essencial para a efetivação dos direitos sociais previstos na Constituição.
O relator ressaltou que a exigência de equilíbrio fiscal não impede a adoção de políticas públicas, mas assegura que elas sejam planejadas de forma responsável, evitando o endividamento e a perda de capacidade de investimento do Estado. Ele destacou que a inclusão do art. 113 no ADCT, por meio da Emenda Constitucional 95/16, consolidou o princípio da responsabilidade fiscal como parte do devido processo legislativo.
Zanin observou que, embora o Congresso Nacional tenha descumprido inicialmente o dever de apresentar a estimativa de impacto financeiro, o vício foi corrigido posteriormente a partir do acordo institucional entre Legislativo e Executivo, firmado após a concessão da liminar pelo STF.
Diante disso, o relator reconheceu a inconstitucionalidade dos dispositivos questionados, mas sem pronunciar nulidade, preservando os efeitos jurídicos já produzidos pela lei para garantir segurança jurídica e estabilidade das relações fiscais.
Por fim, o ministro reiterou que a decisão visa impedir a repetição de práticas legislativas que desconsiderem o equilíbrio fiscal, reafirmando o papel do Supremo como guardião da Constituição e da sustentabilidade das contas públicas.
Confira o voto do relator.
Histórico
A desoneração da folha foi criada em 2011 como mecanismo de estímulo à geração de empregos, permitindo que empresas substituíssem a contribuição previdenciária patronal de 20% sobre salários por alíquotas entre 1% e 4,5% incidentes sobre a receita bruta. Desde então, o modelo foi prorrogado diversas vezes pelo Congresso Nacional.
Em 2023, o Legislativo aprovou nova extensão do benefício até 2027. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou integralmente o projeto, mas o veto foi derrubado por ampla maioria. Em seguida, o Executivo editou medida provisória revogando a prorrogação, o que levou à reação de parlamentares. O governo então ingressou com ação no STF para exigir a apresentação de contrapartidas fiscais.
Em abril de 2024, Zanin concedeu liminar suspendendo trechos da lei que prorrogavam a desoneração e fixando prazo de 60 dias para que Congresso e Executivo negociassem uma solução.
O acordo resultou na sanção presidencial, em setembro do mesmo ano, de uma nova lei que manteve a desoneração em 2024 e estabeleceu reoneração gradual entre 2025 e 2027, com retorno à alíquota cheia em 2028. Ainda assim, a ação permaneceu em tramitação para definição da tese jurídica sobre a constitucionalidade das prorrogações sem compensação expressa.
Não é a primeira vez que o tema chega ao Supremo. Em 2021, ao relatar ação semelhante, o então ministro Ricardo Lewandowski votou pela rejeição de pedido da AGU contra prorrogação anterior da desoneração, afirmando que a medida não configurava novo benefício fiscal por já integrar a política tributária vigente. O julgamento não foi concluído.
Pareceres emitidos à época por Câmara, Senado e PGR também sustentaram que a prorrogação da desoneração não viola a Constituição nem a lei de responsabilidade fiscal por ser continuidade de política estabelecida desde 2011. Já o governo argumenta que o impacto fiscal estimado – de R$ 20,2 bilhões em 2025, segundo manifestação da AGU – exigiria compensação formalizada.
Processo: ADIn 7.633
Fonte: Migalhas, por Assessoria Jurídica Tributária da FETCESP / Foto: Banco de Imagens – Canva