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Manobrar grandes navios requer cuidado e prática

Acidente com navio em Veneza, na Itália, traz à tona questões de segurança sobre manobra de grandes embarcações.

 

Veneza, Itália, 2 de junho de 2019. O navio MSC Opera, com 54 m de altura e 275 m de comprimento, levando 2.679 passageiros a bordo, segue sem controle em direção a uma embarcação menor com 130 turistas. Dois rebocadores tentam parar o gigante de 66 mil toneladas, mas um dos cabos se quebra com o impacto e a pressão contra a água. A colisão é inevitável. Quatro pessoas ficam feridas.

O acidente coloca em discussão a importância do cuidado durante as manobras de grandes navios, sejam eles de cargas, sejam de passageiros, que circulam ao redor de todo o mundo. Entre as hipóteses para as causas do acidente em Veneza, o travamento do motor é a mais provável. Em situações assim, a habilidade de quem está no comando é fundamental para minimizar os impactos e evitar uma tragédia com danos maiores.

É aqui que entra a figura do prático, profissional responsável por “estacionar” os navios. A praticagem é uma atividade privada que tem sua origem no Brasil, no início do século 19, quando da chegada da Família Real. Segundo a Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário, “a praticagem consiste no conjunto de atividades profissionais de assessoria ao comandante, requeridas por força das peculiaridades locais que dificultem a livre e segura movimentação da embarcação”. 

Para o desenvolvimento da atividade, a costa marítima e os rios do país foram divididos em 22 ZPS (Zonas de Praticagem), sendo cada uma responsável por um grupo de portos, nos quais o serviço deve estar permanentemente disponível. No Brasil, 95% do comércio exterior se dá por via marítima e, nesse cenário, a praticagem é peça fundamental para diminuir o risco de acidentes nos portos.

Como se forma um prático

Organizado e fiscalizado pela Marinha do Brasil, o processo seletivo para ser um prático é aberto para qualquer pessoa que possua ensino superior completo em qualquer área de formação e habilitação de mestre armador. O candidato aprovado no processo torna-se um aquaviário na categoria de “Praticante de Prático”, passando por um programa de qualificação que tem prazo mínimo de 12 meses e máximo de 18 meses, sem opção de renovação.

Para definir a quantidade de práticos no país e as vagas a serem autorizadas para cada Zona de Praticagem, a DPC (Diretoria de Portos e Costas) considera a expectativa do tráfego de embarcações (decorrente de sazonalidades, investimentos, desinvestimentos ou fatores naturais); a relação entre o número de práticos habilitados e o efetivo da ZP; a manutenção da qualificação dos práticos; as especificidades de cada ZP; e os custos para a União. Atualmente, existem 627 práticos habilitados para atuarem nos portos do Brasil.

O Conapra (Conselho Nacional de Praticagem) afirma que os práticos estão sempre treinando para lidar com os desafios da profissão, inclusive em simuladores e modelos tripulados reduzidos. “Além da obrigatoriedade de realizar a cada cinco anos o ATPR (Curso de Atualização para Práticos), organizado pelo conselho por delegação da Autoridade Marítima, o prático participa, regularmente, de treinamentos no Brasil e no exterior, por meio de investimento das entidades de praticagem”, afirma o Conapra em nota.

A USP (Universidade de São Paulo) mantém, desde 2010, um simulador marítimo hidroviário com foco no estudo de manobrabilidade de embarcações de forma geral, tendo como uma das possíveis aplicações a engenharia portuária para a realização de testes. O simulador permite o controle humano sobre a embarcação e possibilita análises sobre a viabilidade de uma operação portuária e a adequação de uma instalação portuária ou de um acesso náutico. “Nosso simulador permite realizar casos especiais bem como possibilita a análise de situações de risco. O simulador traz representações dos portos, dos navios no canal e de operações próximas aos terminais. O simulador é um apoio para a preparação de operações onde os práticos fazem avaliação de manobras de navio e de acesso ao porto. Existem aulas teóricas e práticas em que podemos mudar o tamanho do navio e a manobra”, explica o professor de controle de embarcação da USP, Hélio Morichita. 

Procedimentos

De acordo com Morichita, quando um navio chega a canais para atracação, como no caso de Veneza, a responsabilidade da manobra é do prático. “É ele quem define o número de rebocadores. Mas, mesmo que o prático tenha feito o planejamento adequado, um defeito mecânico pode acabar em acidente”, alerta o professor.

No Porto de Santos (SP), onde, em 2018, foram realizadas 92 atracações de transatlânticos, o processo de atracamento de navio é realizado por um grupo de amarradores que varia de acordo com o tamanho da embarcação: quatro para navios de até 100 m; oito para embarcações entre 100 m e 250 m; e 12 ou até 14 para navios maiores ou que envolvam cabos de aço. Durante o processo, os amarradores posicionam-se nas extremidades dos navios, descem os cabos e mantêm-se afastados até que estes sejam arriados para a amarração.

Em nota, a superintendência de comunicação do porto informa que a preparação para o atracamento é feita a partir do conhecimento do local, horário e tamanho do navio. A escolha do prático obedece a regras e escalas internas da própria Cooperativa dos Práticos, sem interferência da Administração Portuária. “O profissional necessita ser um oficial de náutica com comprovada experiência, aprovado em concurso específico dessa categoria. O controle do navio é exercido exclusivamente por seu comandante durante as manobras dentro do canal de navegação do porto.

O comando do navio acata as orientações transmitidas pelo prático sobre as particularidades do canal. É obrigatória a praticagem nos navios que atracam no Porto de Santos”, afirma a superintendência do terminal. É importante destacar que todos os dados referentes ao navio, ao local de atracação e às condições de tráfego e meteorológicas são informados e devem ser analisados de maneira antecipada à atracação. Isso foi o que aconteceu no fim de maio, no Porto de Paranaguá (PR), durante a movimentação da maior quantidade de grãos para exportação da história do terminal: 90 mil toneladas de farelo de soja – o equivalente a mais de 2,5 mil carretas carregadas. A operação durou quatro dias e foi realizada pela embarcação chinesa Lan Hua, maior navio graneleiro já recebido no corredor de exportação, com 254 metros de comprimento e 43 metros de largura – tamanho superior ao de dois campos de futebol. Em média, os navios que chegam para carregar granéis sólidos no Porto de Paranaguá medem entre 199 m e 229 m de comprimento, embora o porto esteja preparado para carregar navios conteineiros de até 365 metros.

“Para uma operação desse tamanho, em primeiro lugar, recebemos da embarcação a intenção de atracamento. A partir daí, preparamos os berços e fazemos um planejamento de acordo com o tamanho do navio e a quantidade de carga. Ele chega e obedece a uma fila por ordem de chegada. Quando a carga que será levada estiver no porto, ele é autorizado a atracar. Nesse momento, o prático conduz o navio com o auxílio de rebocadores”, explica o diretor operacional de Paranaguá, Luiz Teixeira.

No Porto de Paranaguá, Teixeira destaca que o movimento de chegar à beira do cais e se aproximar do berço é muito lento. Por isso, eles utilizam sempre dois ou três rebocadores, que estejam em condições de uso.

Além disso, existe uma norma que estabelece a potência e, caso haja um acidente, será aberto um inquérito pela capitania dos portos. “Quem estabelece o número de rebocadores é o prático. Quem cuida da segurança da embarcação é a praticagem. O responsável pelo navio é o comandante. Quando o prático assume o navio, ele vira comandante.”

 

FONTE CNT