Leilão de rodovias entra na fase “híbrida”
Novo modelo mescla redução de tarifas de pedágio com aumento da outorga paga ao governo.
O governo Jair Bolsonaro deve inaugurar uma nova fase do programa de concessões de rodovias federais em 2020. A mudança virá com ajustes no critério de apresentação de lances durante o leilão, modelo chamado de “lances híbridos”. Na disputa, as empresas vão apresentar propostas com descontos sobre a tarifa teto de pedágio. Ao atingir o percentual máximo de deságio por mais de um concorrente, a disputa passa a ser pela oferta do maior valor de outorga.
A inovação no programa de concessões de rodovias chegará com dois leilões programados para o próximo ano. Um deles é a concessão do trecho da BR-381/262 que liga as cidades mineiras de Governador Valadares, João Monlevade e Belo Horizonte ao município capixaba de Viana. O certame está previsto para junho de 2020
O segundo leilão envolve o contrato de concessão da BR-153/414/080, que conecta Aliança do Tocantins (TO) a Anápolis (GO). A concorrência está prevista para agosto do que vem.
A estratégia surge como mais uma lição da terceira etapa de concessões, promovida pelo governo Dilma Rousseff (PT). O modelo de lance híbrido é defendido pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas. A ideia é evitar que o interesse desproporcional de algumas empresas coloque em risco o equilíbrio dos contratos no longo prazo.
A nova configuração de disputa não havia ficado pronta a tempo de ser levada para a próxima concessão de rodovia, o trecho de 220 quilômetros da BR-101, entre as cidades catarinenses de Paulo Lopes e São João do Sul. O edital já está na praça e o leilão marcado para 21 de fevereiro.
Nas duas primeiras experiências de leilões com lance híbrido, o limite de desconto sobre a tarifa de pedágio pode ficar em 12%. Este percentual foi apresentado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), na consulta pública. O valor definitivo será indicado na versão final do edital. Na prática, a segunda fase da disputa, com oferta de lances pela outorga, funcionará como critério de desempate entre empresas.
O presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), César Borges, disse ao Valor que a iniciativa do governo ajuda a manter o equilíbrio financeiro do contrato ao longo dos 30 anos da concessão. Outra vantagem, destacada pelo executivo, é a possibilidade de “modular” os preços de pedágios entre rodovias integradas.
“O governo terá a oportunidade de aproximar o valor das tarifas. Quando existe uma variação muito grande, a concessão com tarifa maior pode ser inviabilizada”, disse Borges. Segundo ele, o governo pode aumentar ou diminuir o limite de desconto para aproximar os valores e evitar a percepção negativa sobre a concessão de novos trechos com pedágio um pouco mais caro.
Borges, que foi ministro dos Transportes na gestão Dilma, considera que o lance híbrido pode ser uma marca do atual governo no programa de rodovias federais. Ele frisou que Fernando Henrique (PSDB), pela necessidade de gerar caixa para o governo, priorizou disputas pelo maior valor de outorga. Isso elevou o custo dos pedágios a patamares maiores.
Houve uma inversão da lógica de gerar maior arrecadação nos governos petistas. Tanto o ex-presidente Lula como Dilma preferiram estimular a cobrança reduzida nas praças de pedágio.
O caso mais emblemático de frustração pelos deságios muito agressivos ocorreu na concessão da BR-040, em 2013. O grupo Invepar propôs um desconto superior a 60% na ligação Brasília-Juiz de Fora (MG). Hoje, a concessionária tenta devolver a concessão por não conseguir honrar os compromissos de investimento.
Na gestão Michel Temer, houve o esforço para proteger os contratos de investidores “aventureiros”. Os editais definiram que, para cada novo desconto, o futuro concessionário deveria se comprometer a integralizar capital nas sociedades de propósito específico (SPEs), responsáveis por administrar as estradas.
A regra do governo anterior foi aplicada à Rodovia de Integração do Sul (RIS), que liga Rio Grande do Sul a Santa Catarina e à BR-364/365 entre Jataí (GO) e Uberlândia (MG), leiloada no fim de setembro. O parâmetro também valerá para o trecho catarinense da BR-101 que será ofertado no início de 2020.
O modelo de lance híbrido ainda será analisado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Ele incorpora outros avanços defendidos pelo ministro da Infraestrutura. Um deles está relacionado à outorga variável, que permite o pagamento parcelado ao governo em valores compatíveis ao fluxo de caixa e à variação do câmbio com proteção ao investidor estrangeiro. Também inova ao trazer a tarifa dinâmica, que mantém reduzido o valor do pedágio nos trechos sem duplicação.
FONTE GLOBO VALOR