ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins e a indefinição do Supremo
A aprovação de qualquer reforma tributária não será suficiente para assegurar um ambiente de negócios estável enquanto a Corte que deveria colocar fim aos litígios não o faz.
O Supremo Tribunal Federal incluiu na pauta do dia 5 de dezembro o julgamento dos embargos de declaração do recurso extraordinário que discute a constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins. O tema é conhecido de todos. O Supremo discute a tese há duas décadas. Apenas em 2017, porém, chegou a uma definição: o ICMS deve ser excluído da base de cálculo destas contribuições. Tal definição no entanto, é apenas o primeiro passo de um longo caminho para a solução do litígio.
Em primeiro lugar, a Corte deverá decidir se irá modular os efeitos da decisão, tal qual requerido pela Fazenda Nacional. Valendo-se de argumentos de fundo financeiro, vinculados ao suposto prejuízo bilionário que a União sofreria com a ausência de modulação, a Fazenda requereu que a decisão apenas produzisse efeitos a partir da data do julgamento dos embargos de declaração.
Como já destaquei em outro texto desta coluna, o Ministério Público Federal proferiu parecer favorável a tal pedido, fundamentando-se nos impactos nas contas públicas que uma decisão em sentido diverso teria. Sobre isso, reitero: o uso indiscriminado e retórico da crise fiscal e econômica pela qual passa o país não pode ser razão para modular efeitos de julgados proferidos pelo Supremo.
Após a decisão sobre a modulação (ou eventualmente antes dela), o Supremo tem uma outra tarefa: definir qual ICMS será objeto de exclusão da base de cálculo das contribuições. O debate, nesse ponto, não é trivial. Há duas teses centrais em disputa: os contribuintes alegam que o ICMS a ser excluído da base de cálculo é aquele destacado na nota fiscal, enquanto a Fazenda Nacional pretende ver o ICMS efetivamente devido, isto é, aquele apurado na escrita fiscal do contribuinte, retirado da base de cálculo do PIS e da Cofins. Não há qualquer pista sobre qual será a compreensão da Corte sobre o tema.
Em verdade, o que temos hoje é um tribunal absolutamente omisso em matéria tributária. Como destaquei no começo do texto, o debate sobre a constitucionalidade de se incluir o ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins está posto no Supremo desde 1998. Em 2017, quando, enfim, decidiu o tema em repercussão geral, o tribunal demorou sete meses para a publicação do acórdão. Publicado o acórdão, a Fazenda opôs embargos de declaração para discutir a possível modulação de efeitos. Passados dois anos da oposição dos embargos, o julgamento ainda não ocorreu.
Nesse meio tempo, empresas obtiveram decisões transitadas em julgado reconhecendo a exclusão do imposto da base de cálculo das contribuições, decisões essas que aplicam a tese que o Supremo se recusa a decidir. A Receita Federal, de seu lado, manifestou-se quanto à sua interpretação (mais restritiva) da tese e os contribuintes seguem com o justo direito de defender a interpretação mais ampla.
Essa indefinição gera desconforto e insegurança para todos, Fazenda e contribuintes. Atualmente, a pauta do direito tributário tem sido ocupada pelas propostas de reforma tributária em discussão no Poder Legislativo. A aprovação de qualquer proposta que seja não será suficiente para assegurar um ambiente de negócios estável enquanto a Corte que deveria colocar fim aos litígios não o faz. A estabilidade jurídica depende não apenas de leis de aplicação clara e isonômica, mas, substancialmente, de um Poder Judiciário que seja capaz de encerrar disputas. No direito tributário, a regra tem sido a omissão recorrente.
FONTE VALOR GLOBO